sexta-feira, 13 de fevereiro de 2015

A favor da vida de quem?

O post sobre o aborto fez muito sucesso! Foram inúmeras curtidas em 2 dias no Brasil Post (mais de 18 mil) e vários compartilhamentos. Mas teve também muitooooo ódio! Muito xingamento e muita gente tentando me convencer de que aborto é assassinato e usando técnicas de retórica e dialética com as quais eu não concordo mas que tem uma certa coerência dentro da lógica da pessoa. 


Por isso sinto a necessidade de responder de forma coletiva pois realmente não tem como rebater cada argumento já que partimos de premissas diferentes e eu disse isso no texto ("contra dogmas não há argumentos"). 



Para quem acha que o feto é uma vida EQUIVALENTE à vida da mulher ficaremos aqui até o final dos tempos e não concordaremos nunca com a descriminalização. Todos os argumentos que foram colocados de que "o assassinato é crime, o assalto é crime então teria que liberar assalto também porque os assaltantes correm risco de vida, bla bla bla, que uma coisa não justifica a outra" e muitos outros, partem dessa premissa que para mim é equivocada. 



O FETO NÃO É EQUIVALENTE EM DIREITOS À MÃE!!! 


Você pode acreditar que é mas o Estado Brasileiro não acredita! E é ele quem precisa ser coerente. Se o Estado brasileiro acreditasse que o feto e a mãe têm os mesmos direitos ele não permitiria as hipóteses de aborto legal, seriam emitidas certidões de óbito e juridicamente ele é considerado apenas um sujeito com "expectativas de direito" até que nasça vivo. A personalidade civil da pessoa depende do nascimento com vida. Isso quer dizer que o feto não tem direitos? Não! Isso quer dizer sim que ele tem MENOS direitos! Isso quer dizer que o direito da mãe PREVALECE, quando conflitante com o direito do feto! 


Então, eu respeito a crença de cada um mas dizer que aborto é assassinato é uma questão de fé e não de jurídica e muito menos de Estado. O Estado brasileiro tem que se preocupar com as suas cidadãs e essas cidadãs estão morrendo por um apego e lobby religioso. 



O aborto, assim como as drogas, é uma questão de saúde publica! A criminalização não é o caminho para nada, especialmente em um país como o nosso com o sistema prisional falido! O acolhimento e a conscientização sim! Ou vamos mandar para cadeia mulheres que fumam, bebem e/ou usam drogas na gravidez por lesão corporal? Dolosa de preferência... 



Muitos também disseram que o homem não aborta e que é só a mulher pedir pensão! E que essa seria de fato a única dívida que dá cadeia no Brasil. 



Em resposta a esse argumento só posso dizer HA HA HA!



Para o cara ir para a cadeia por não ter pago pensão tem que ter tido antes uma sentença que tenha arbitrado tal pensão e ele tenha deixado de pagar, sentença esta que pode demorar meses e que muitas muitas vezes é baseada apenas no que o cidadão ganha formalmente. A maior parte dessas mulheres não consegue demonstrar por falta de provas quanto o cidadão realmente ganha. Isso quando ele de fato ganhe algo e não seja também um duro assim como a mãe! Além disso, esses comentários consideram que a mulher e o cara sejam casados ou que o cara tenha assumido a paternidade, o que é uma ínfima realidade em casos de aborto. Ou seja: ela ainda tem o trabalho de provar a paternidade antes! 



E até lá? Quem teve que levar uma gravidez a termo sofrendo seus efeitos físicos e psicológicos? Quem teve que correr atrás de advogado (ou da sobrecarregada defensoria?) para ir atrás de seus direitos? Quem foi julgada, abandonada e muitas vezes humilhada, por "não ter se cuidado"? Quem deixou de namorar, de ter sonhos? O homem é que não foi... 



Se todos esses argumentos não são suficientes para que você seja a favor da descriminalização (já desencanei de te convencer quanto à legalização!), tudo bem, realmente não serei eu a convencê-lo! 



Agora, a minha dificuldade é entender como pessoas que se dizem cristãs desejam a morte dessas mulheres (sim recebi muuuuitooos comentários nesse sentido!!). Quem defende a vida não pode me mandar frases como: "tem tudo que morrer mesmo bando de piranha assassina" ou "na hora de abrir as pernas não pensou nisso, agora melhor que morra mesmo para não engravidar de novo". 



Todo esse cuidado com a vida de alguém que nem nasceu e total descaso e crueldade com a vida de uma mulher desesperada? 



Quem já acompanhou alguém que abortou ou já abortou sabe o desespero que bate... os sonhos que passam a ser todos questionados, o medo do julgamento, o medo do aborto em si, o medo de Deus para as que acreditam (e sim! acreditam mas no desespero também abortam!) 



Por alguma razão (hoje sei qual) eu nunca engravidei e não tive que me por nesse dilema para ter que pensar no que "eu faria" mas isso não me impede de me solidarizar e de não querer que tantas mulheres sejam esculachadas em praça pública dessa forma e ainda por cima mandadas para a cadeia! 



Admiro sim quem, mesmo com tantas adversidades e com tudo contra e sabendo que criarão uma criança sozinhas optam por manter a gravidez e serem mães! Acho lindo e jamais diria a uma amiga: puts aborte! Mas sim, eu diria: "amiga, pense, respire, reflita e decida sabendo que estou ao seu lado qualquer que seja a sua decisão!" 



Ser cristão deveria significar ter compaixão! Essas mulheres não são assassinas e se o são os pais são tanto quanto... esse tema mexe tanto comigo pois, embora nunca tenha vivido na pele o julgamento, por alguma razão ele traz a tona um ódio indescritível que não consigo conectar com os ensinamentos de Cristo! O que houve com o "não julgarás"? Com o "olhe para o seu olho antes de querer tirar a palha do olho do outro"? São tão perfeitas e irretocáveis essas pessoas que julgam e condenam quem aborta? 



Mais amor! Mais compaixão... esse sim foi o legado de Cristo! Que acolhia os pecadores e não os julgava! Que abraçava as prostitutas, os leprosos e desprezava os fariseus pela sua hipocrisia! 



Se o argumento do amor cristão ao próximo  não é suficiente pense apenas que a vida é estranha e o mundo é redondo... amanhã pode ser a sua filha naquela clinica açougueira, pois ao saber que a mãe e o pai eram tão radicalmente contra o aborto, preferiu não contar que não queria abrir mão daquele curso no exterior logo após a faculdade. Pode ser sua irmã, tomando um remédio que a leve a óbito! Você pode não concordar com o que elas fizeram, mas acham mesmo que elas mereçam: (i) morrerem; ou (ii) serem enviadas para o sistema prisional brasileiro por esse "crime"? 



Se a sua resposta ainda assim for SIM, por favor, não fale mais comigo sobre esse assunto! Podemos continuar amigos, mas me embrulha um pouco o estômago tamanha crueldade e julgamento... melhor falarmos de outra coisa! 


2 comentários:

  1. Tayná, seu texto apresenta argumentos que têm fundamento. Discordo deles, mas os respeito. O grande problema é trazer uma mentira absurda que não se sustenta em nenhum dado oficial, apesar de você responder a alguns que "são dados do governo", eles não são. Esses números fantasiosos são chutes de algum emissário tresloucado da ONU. Não há NENHUM documento estatístico que chegue perto do número apresentado.

    É simplesmente IMPOSSÍVEL que 200 mil mulheres morram em abortos clandestinos. Em 16 anos o Ministério da Saúde (no últimos 12 anos comandado pelo PT) registrou 1500 mortes por abortos de qualquer natureza, legais ou ilegais.

    Portanto, defenda a legalização com os bons argumentos que você já tem, mas sem mentiras estatísticas grosseiras e fora da realidade. Isso engrandece o debate.

    Outro ponto importante: as pessoas contrárias à criminalização do aborto apresentam sua causa como se houvesse milhares de mulheres presas por praticar aborto. Sabe quantas mulheres foram detidas, presas e/ou condenadas por praticar aborto? ZERO, NENHUMA, NIHIL.

    E para finalizar: não trate as pessoas que são contrárias ao aborto com a típica condescendência com que alguns intelectuais tratam os ignorantes. Há vida inteligente deste outro lado do debate, não apenas fanáticos religiosos ou falsos moralistas.

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  2. Daniel, obrigada pelo seu comentário! Foi bem ponderado e eu entendo sua irritação com a citação aos números. Confesso que o número aqui para mim era tão menos relevante do que a causa que eu apenas o usei para dar mais ênfase ao meu argumento e busquei os números que encontrei. Você tem razão que o número é da ONU e acho que não me cabe aqui debatê-lo ou desmerecê-lo pois sendo muito sincera sei o como números costumam ser usados para manipular qualquer ideologia e argumento. Exemplos não faltam. Então vou dar-lhe razão quanto à questão do número e reforçar a argumentação teórica e ideológica que mexe no meu íntimo com o que creio ser algo básico: empatia!
    Obrigada pelo seu comentário. Ele me fez refletir e para os próximos posts certamente tomarei mais cuidado com os números (nem que seja construindo o argumento sem os mesmos!). Quanto à condescendência, me desculpe, ranços de determinadas discussões que me desestabilizam um pouco... risos Sei que há vida inteligente do outro lado de debate e inclusive tenho muitas pessoas que amo deste outro lado, mas como sempre escrevo como forma de desafogar ideias e pensamentos, as emoções me tomam e a palavra escrita pode dar um tom diferente do que eu desejava. Este é um efeito colateral mas não pretendo "mudar" pois a escrita serve justamente para essa catarse. Mas após a reflexão entendo o que você quis dizer e agradeço pela contribuição! De coração! Abs

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