A gente olha aquela tira branca
procurando por uma linha fantasma que seja. Entorta os olhos, fica vesga,
aperta até ficar com dor de cabeça, coloca contra a luz, vira de ponta cabeça e
até fecha os olhos por uns 10 segundos para abri-los com a esperança de que um
milagre tenha acontecido, e nada! Mais uma vez “não foi dessa vez”.
Se você não está tentando
engravidar provavelmente não sabe nem do que eu estou falando e talvez ache
completamente sem noção esse esforço visual todo para algo que está tão claro e
escancarado na sua frente.
Diferentemente de outras dores, a
dor do tentar é daquelas que fica cada vez pior. Cada mês que passa parece que
acumula um pouquinho da dor do mês passado, até que um dia você se pega sentada
na privada olhando para o nada com aquela tira branca em uma mão e o coração na
outra e não consegue levantar! Não consegue chorar, não consegue nem se
mexer... só fica olhando... o azulejo branco do seu banheiro que parece tão
frio nesse instante... Não tem como não se perguntar: “por que eu não?” Não tem
como não se sentir inferior! A não ser é claro que você seja de fato superior no
quesito iluminação... não parece ser o meu caso!
Você tenta ressignificar e a
maior parte do tempo até consegue! Mas não agora! Não com a enésima tira em
branco nas mãos! Não quando você estava tão esperançosa com aquele enjoo que
sentiu pela manhã (e que demonstrou ser apenas nervoso ou estresse). Não! Por
um átimo só o que você quer é apenas sumir... só o que você quer é gritar até
perder a voz e xingar de todos os nomes possíveis seja lá qual for o deus/a da
reprodução que esfrega na sua cara mensalmente que você não é digna! O desejo
pulsante é de esbofetear essa divindade que parece olhar ironicamente no seu
olho e zombar de todo esse amor que você acha que tem para dar. Consigo até
enxergar no azulejo o olhar zombeteiro por todos os livros e artigos sobre parto
e criação com apego que você leu ou pela forma patética com a qual você sonha
diariamente com o como você será uma mãe amorosa, amiga e carinhosa, em como quer
ser confidente e parceira...
Ele te zomba a cada anúncio de
gravidez ao seu redor... te zoa e te faz sentir culpada... te faz sentir a
pessoa mais desumana e egoísta do mundo quando chora sozinha ao receber um
convite de chá de bebê... te faz sentir tão “não você!”. E de alguma forma
esfrega mais uma vez na sua cara que a culpa há de ser sua... que esperou, que não
tentou antes, que fumou, que bebeu, que tomou pílula, que não perdeu peso, que
não relaxou, que fingiu ter esquecido, que fingiu não querer mais, que esqueceu
de tomar o ácido fólico ontem, que está muito estressada, que não é uma boa
filha, uma boa esposa, uma boa amiga... a culpa de alguma forma é sua e a prova
está na sua mão tremula... !!! Essa maldita tira te joga um balde de bosta na
cara e te lembra de como você é imperfeita em toda a essência do seu ser...
Após o meu texto sobre a
ansiedade ligada às tentativas as pessoas pararam de me pedirem para relaxar
(ufa!) embora perceba que secretamente muitas ainda pensem que só não
engravidei ainda porque não relaxei...
Bom, relaxar não é mesmo o meu
negócio... mas sou muito boa em me ocupar! E é exatamente o que tenho feito nos
últimos meses... ocupado cada segundinho do meu dia com mil e uma atividades,
leituras, filmes, trabalho e aulas que tirem o foco da gravidez (ou ausência
dela) e façam o tempo parecer andar mais rápido... funcionou! A maior parte do
mês não penso nisso e os dias voam... claro que, se paro por um minuto que
seja... é, o negócio é não ficar parada!
Mas e o que faz nesse momento? O
que faz quando a tira te bate na cara com um soco inglês? O que fazer quando começa
a sentir a menstruação vindo e tenta de um jeito meio maluco quase que se contorcer
fisicamente para que ela fique lá... que não venha... não dessa vez! Sim dessa
vez... de novo não foi dessa vez!
Você sai do banheiro sorridente tentando
não entristecer a outra pessoa que sonha com aquilo tanto quanto você mas o
sorriso é amarelo... e, afinal de contas a pessoa te conhece o suficiente para
saber que algo está errado... e só de te olhar ela já sabe o que é... ficam em
silêncio. Os dois ali...em silêncio... a lágrima molhando o peito que sempre te
acolhe e naquele espaço e tempo é só silêncio...silêncio e vazio...
E então mais uma vez você se
lembra que a melhor (ou única) forma com que aprendeu a se defender da dor
continua eficaz: engole o choro e bola pra frente pois o mundo não vai parar
para você sofrer por algo que nunca teve... e não sabe se terá...
É! Não foi dessa vez! Mas mês que
vem será... se Deus quiser! Amém!
Poderá gostar de: Sobre tentar engravidar Vivendo e aprendendo
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Simplesmente eu! 😢
ResponderExcluirSeu texto é perfeito e reflete exatamente o que eu sinto todo santo mês há 1 ano e meio!
ResponderExcluirDa ação à reação, a descrição perfeita do que eu e inúmeras mulheres passam todos os meses...
ResponderExcluir"É! Não foi dessa vez! Mas mês que vem será... se Deus quiser! Amém!"
Texto fiel a realidade 😢
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