quarta-feira, 22 de julho de 2015

Sobre o ativismo e a empatia




Muito antes de existir Facebook eu já era assídua frequentadora de discussões e como já falei aqui nunca fui de “arregar” e só costumava parar de argumentar quando achava que tinha convencido o interlocutor. Com o tempo descobri que na maior parte das vezes a única coisa da qual a pessoa tinha se convencido era de que me dar razão aparentava ser a saída mais fácil e, por vezes, de que eu era chata para cacete. O amadurecimento me fez aprender também que ninguém se convence com agressividade e tom professoral ou condescendente e que ouvir muitas vezes é o melhor caminho para o diálogo. Minhas discussões começaram então a ser divididas entre: 1) “quero mostrar um ponto diferente para esta pessoa que eu amo/aprecio/admiro”; 2) “acho que não vamos chegar a lugar nenhum então melhor não discutir esse tema pois pode agredir! Vamos falar de coisas que nos unem”; 3) “quero só que esse imbecil saia da minha frente e pare de falar asneira”; e 4) “to cagando, deixa esse bosta falar o que ele quer”. Isso se tornou ainda mais necessário ao me descobrir feminista, estudar cada vez mais o assunto e circular mais e mais nesse meio que é, e deve ser, por natureza combativo. Em uma releitura do “ser feliz ou ter razão” comecei a me perguntar o que eu desejava: brigar com todos os meus amigos e familiares ou mudar o mundo?

Posicionar-se é imprescindível! Ter coerência também, mas o que tenho visto excessivamente nos discursos é uma completa falta de empatia com o ser humano do lado de lá! Sim, do lado de lá temos pessoas com opiniões divergentes muitas vezes difíceis de serem engolidas mas não podemos esquecer que pessoas são mais do que pautas ideológicas e argumentação política! Pessoas tem histórias, dores e sofrimento! Pessoas tem intenções muitas vezes nobres embora possam agir de forma equivocada ou mal informada! Pessoas tem sentimentos e os ataques contínuos apenas nos distanciam e nos isolam em feudos ideológicos que dificilmente trarão os resultados esperados no menor espaço de tempo desejado. E isso vale para todas as pessoas, inclusive machistas, racistas e preconceituosas. Quem sou eu para pegar a minha varinha de feminista e sair atacando machistas quando eu mesma até pouco tempo reproduzia inúmeras atitudes altamente machistas? Quem sou para julgar a pessoa que a vida inteira cresceu imbuída de conceitos racistas e preconceituosos e dizer que elas não merecem viver? Quem sou eu? Pessoas podem ser racistas e homofóbicas e altamente honestas e éticas, assim como ativistas de esquerda que defendem a igualdade e fraternidade aos quatro cantos podem ser machistas e misóginas. Feministas podem ser corruptas e ativistas do Greenpeace podem estar neste momento batendo em seus filhos! Sim, porque ninguém é SÓ uma coisa! Todos somos múltiplos e complexos e rótulos distanciam justamente porque a pessoa não se identifica com o que o limita a algo que não a descreve corretamente. 

O caso Gregório Duvivier e do vídeo infeliz do Porta dos Fundos sobre o universo trans é um bom exemplo disso. Não estou aqui querendo justificar atitudes imbecis reiteradas como as do Danilo Gentili, por exemplo, mas os ataques que li ao Gregório para mim foram um bom exemplo da demonização do ser humano ao invés da crítica ao argumento, ao erro, ao fato em si! Ok, o vídeo é ruim! Ok, ele errou! Mas isso anula tudo de bom que ele tem feito? Isso anula por completo as intenções? Acredito que não! E mais: acredito que esse tipo de ataque apenas isola e afasta quem está bem intencionado e desejando apoiar seja lá qual for a causa!

Uso esse exemplo apenas para ilustrar algo sintomático em inúmeros debates inclusive e, talvez principalmente, por parte dos ativistas. Tenho entrado em muitas páginas feministas e de movimentos negros e LGBTs e vejo muita agressividade dirigida à pessoa e não ao argumento. Vejo também muito despreparo técnico para a resposta fundamentada. Não é porque você é de esquerda e feminista ou negra que pode responder com “porque sim e cala a boca seu macho de merda” a uma ponderação sensata e indagativa! Eu entendo a agressividade e até a endosso mas não creio realmente que rotular as pessoas de “A” ou “B” nos ajude a chegar a lugares muito interessantes. A luta é normal e o sentimento do oprimido contra o opressor é justificado mas na minha luta prefiro acreditar que estender a mão e acolher é muito mais efetivo do que dar o troco na mesma moeda.

Um outro caso que me chamou atenção foi uma discussão num grupo de mães sobre o texto da escritora queafirmou se tornar uma mãe melhor ao fumar maconha. Muito bem, os comentários se dividiram entre: julgar a mulher que fuma maconha como uma irresponsável ou julgar as que a julgavam como hipócritas viciadas em antidepressivos. Gente, sério, a discussão poderia ser tãaaaaaao mais interessante... a troca de experiência então nem se fala! Mas, ao optarmos por julgamentos (normalmente rasos) caímos em falácias e equívocos como o de tachar mulheres com depressão e que fazem uso de remédio de “patricinhas mimadas” e mulheres que apoiam o uso da maconha de “naturebas irresponsáveis”. E o mesmo ocorre quando se fala de qualquer assunto: parto, amamentação, criação, voto, estilo de vida, crenças, futebol e por aí vai!


Somos todos seres falhos e apontar dedos para as pessoas o tempo inteiro além de ser simplista, já que as coloca em caixas que não as definem por inteiro, é extremamente perigoso para a nossa própria coerência. É o famoso cuspir pra cima! Eu já julguei muito e já quebrei muito a cara me vendo na situação exata que anos antes estava julgando! Na busca pelo autoconhecimento e como coach minha missão é aplicar o julgamento zero! Claro que é muito difícil, se não impossível, mas necessário, diria até imprescindível de ser buscado. O julgamento é inerente à nossa condição humana e social mas o esforço de desconstrução e autoavaliação para então exercer a empatia e a compaixão é o passo que todos precisamos dar.

Quem me conhece ou me acompanha há algum tempo pode estar estranhando esse posicionamento já que continuo tendo opiniões fortes e bem definidas, inclusive públicas, mas a discussão aqui é o julgamento e a falta de empatia às pessoas! Eu não tenho e continuarei não tendo qualquer tolerância com argumentos machistas, racistas, preconceituosos em geral, mas tenho tentado sempre exercitar a empatia pela pessoa que os profere e entender o porquê daquele posicionamento antes de gostar ou desgostar de alguém. É o famoso condenar o “pecado” e não o “pecador”. Ressalvadas as exceções, grande parte das pessoas tem uma história de vida singular que explica sua visão de mundo e seu posicionamento e compreende-los certamente é uma chave muito mais efetiva ao diálogo e ao entendimento do que simplesmente atacá-la e rotulá-la. “Nossa, como você consegue ser amiga daquele cara fã do Bolsonaro?” “Afe, não acredito que fulaninha compartilhou um post do Olavo de Carvalho e você ainda a defende”. “Ai agora você fica defendendo comunista??? Vende o seu iphone então!” “Petista, safado e corrupto”. “Playboy fútil”, “Perua deslumbrada” “Homem é tudo isso” “mulher é tudo aquilo” são algumas das afirmativas que tenho ouvido e que geraram esse post.

Já venho falando sobre isso aqui e no meu post mais “popular” o que eu considerava um convite à reflexão interna acabou me gerando uma série de ataques completamente infundados que na época me levaram a refletir também sobre como EU estava enxergando as pessoas “sem noção” da minha timeline.  

Meu convite a todos e todas é então para que possamos debater sim, posicionarmo-nos com certeza, abraçar causas e bandeiras se assim desejarmos, mas para que o façamos com respeito ao ser humano de lá! Que exercitemos empatia pelo mensageiro ainda que repulsa pela mensagem! Sei que não é um exercício nada fácil! Acreditem, eu sou a pessoa menos propensa a esse tipo de prática. Desde que me entendo por gente recebo feedbacks me descrevendo como mandona, intolerante a opiniões divergentes e “alguém que tenta impor a sua opinião nem que para isso tenha que discutir o dia inteiro” (sim isso veio no meu boletim da terceira série!). Mas acredito que quanto mais difícil a prática da empatia e da compaixão mais necessária ela será para mim! Como disse Madre Teresa, “todas as nossas palavras serão inúteis se não brotarem do fundo do coração. As palavras que não dão luz aumentam a escuridão”. Posso assegurar que o caminho é árduo e o exercício é diário, mas a recompensa e a gratificação do genuíno debate, do amor e acolhimento, de trazer para o diálogo pessoas que eu jamais imaginei que concordariam comigo sobre determinados temas é indescritível.

Finalizo então com um grande líder que nos provou o poder do discurso e da luta pacífica ainda que com uma agenda clara e bem posicionada!


Através da violência você pode matar um assassino, mas não pode matar o assassinato. Através da violência você pode matar um mentiroso, mas não pode estabelecer a verdade. Através da violência você pode matar uma pessoa odienta, mas não pode matar o ódio. A escuridão não pode extingüir a escuridão. Só a luz pode. – Martin Luther King 


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