Eu tendo a ser uma pessoa
otimista. Tendo a ser tão otimista que às vezes me sinto como se me tivesse
sido tolhido o direito de ser pessimista ou de ficar triste com coisas ditas banais. O que mais costumo
ouvir quando estou pessimista com algo é: “nossa você já passou por tanta
coisa! Não vai deixar ISTO (com ar de desdém para o problema atual) te desmotivar
não é mesmo??!!” (pausa para tapinha no ombro e o olhar de condescendência)
Sim, é verdade! Eu já passei por
muita coisa foda! Além do mais eu tenho plena ciência e consciência da
quantidade de problemas muito mais fodas tanto dos que eu mesma já passei
quanto daqueles “banais” que estou vivendo hoje. Obviamente eu reconheço que a
fome no mundo, a violência física contra mulheres e crianças, as guerras e os
atos terroristas que acometem o nosso planeta, são muito mais graves do que o
meu frustrado desejo de engravidar ou do que a minha incessante busca pela
realização profissional e pessoal que muitas vezes me deprime.
Ocorre, porém, entretanto,
todavia, que a gravidade dos problemas alheios (ou próprios mas superados, como
parece ser o meu caso) não diminuem a intensidade dos problemas presentes de
maneira alguma, ao menos não na pele. Comentários desse tipo (ainda que venham com o objetivo de encorajamento) nos fazem sentir ainda mais culpados por estarmos sentindo
o que estamos sentindo por algo que supostamente não deveria nos incomodar.
Me peguei outro dia então
pensando e concluindo para depois rapidamente “des-concluir”: será que ter tido
sofrimentos atípicos para a minha tenra idade (leia-se infância e adolescência) me tirou o direito de sofrer por banalidades ou coisas efêmeras da humanidade
pelas quais tantas pessoas sofrem? E ainda: como medir a coerência do
sentimento dor? Em outras palavras: o que determina o que é passível ou
merecedor de sofrimento? Seria obsceno sofrer por uma unha quebrada logo na
saída da manicure enquanto crianças pedem esmola logo ali no semáforo seguinte?
Claro que sim! Mas e pelo coração partido por aquele carinha com o qual você só
saiu 3 vezes? E pela promoção que não veio e pela qual você trabalhou noites a fio? E pelo pneu do carro que furou logo
naquele dia de 40 graus em que você resolveu usar um salto 15 agulha?
Em um primeiro momento me parece
que sim: seria obsceno e certamente despropositado! Indo mais a fundo, porém, nas
raízes do sofrimento que, na maioria das vezes é a frustração, a falta de algo,
a ausência e a perda de coisas que muitas vezes jamais tivemos, concluo que o sofrimento emocional, assim como a dor física, são pessoais e intransferíveis e, para dificultar ainda mais, quase impossíveis de se descrever.
Eu mesma sempre me embanano para descrever minhas dores. Será aguda ou uma pontada? Queima ou arde? É no estômago ou no figado (como se eu tivesse ido a alguma aula de anatomia!). E a intensidade? De zero a 10 qual a intensidade? Sei lá... como vou saber se é 10 se eu ainda não cheguei no 10? É insuportável? Bem, se estou aqui viva é porque é suportável. Defina insuportável...
O mesmo vale para o sofrimento psíquico e emocional. Eu acho!
Eu mesma sempre me embanano para descrever minhas dores. Será aguda ou uma pontada? Queima ou arde? É no estômago ou no figado (como se eu tivesse ido a alguma aula de anatomia!). E a intensidade? De zero a 10 qual a intensidade? Sei lá... como vou saber se é 10 se eu ainda não cheguei no 10? É insuportável? Bem, se estou aqui viva é porque é suportável. Defina insuportável...
O mesmo vale para o sofrimento psíquico e emocional. Eu acho!
Além do mais, a nossa sociedade valoriza o
sofrimento pela falta física: fome (falta de comida), dor física (falta de
proteção), doença (falta de saúde). Por isso escuta-se muitas vezes alguém ser
repreendido por “reclamar de barriga cheia” caso ouse cair de depressão ou
reclamar de algo em sua vida “tendo tudo do bom e do melhor”. Ainda que tenha
um casamento de fachada, um companheiro frio, pais que nunca lhe deram afeto ou
amizades superficiais, sua vida TEM QUE ser boa, pois não lhe faltam bens
materiais.
Me deparo frequentemente com esse
tipo de comentário quando, por exemplo, alguma celebridade vem a público falar
de sua depressão ou infelicidade: “falta do que fazer” “deviam dar uns
problemas de verdade para ela(e) ver o que é bom...” e assim por diante... Outros
despencam para a inveja mascarada de autoafirmação: “tá vendo! Não adianta ter
dinheiro e ter a cabeça fraca!”.
Que loucura é essa!? Quando foi
que perdemos o direito ao sofrimento? Quando foi que nos tornamos escravos da
felicidade e do sorriso obrigatório? (a não ser é claro que estejamos morrendo
de fome...)
Sempre lembro de uma frase sensacional
que ouvi de alguém aleatório cujo nome sequer consigo lembrar: “o seu problema
só não é maior do que o meu porque é seu!”
Julgar o sofrimento alheio é algo
tão equivocado quanto injusto pois a dor não tem medida e muito menos escala!
A dor do outro é dele e a nossa é
nossa mas com um pouco mais de empatia e tato podemos aliviá-la através da
compreensão! Um ombro amigo não julga! Um abraço que acalenta não tenta
diminuir a sua dor, apenas a abraça para aliviar o fardo e o peso e quem sabe enxugar a lágrima.
A frustração é inevitável e a
melhor forma de diminuir a intensidade dos nossos problemas poderia ser a de reduzir a expectativa que gera a frustração. Viver o presente, meditar,
alimentar-se espiritual e emocionalmente me parece um bom caminho, mas nada nos
privará integralmente do sofrimento existencial intrínseco à condição humana.
Essa reflexão não tem o intuito
de encontrar uma resposta ao dilema existencial do sofrimento, mas apenas de
ponderar (mais uma vez e já pedindo desculpas pela insistência) sobre a
empatia. Sobre o silêncio providencial que acolhe. Nem sempre precisamos dizer
alguma coisa ao nosso amigo/amiga que está passando por um problema. Nem sempre
temos que dar um conselho. Muitas vezes tudo que a pessoa precisa é de um
abraço. De um carinho. De um: “eu estou aqui para o que você precisar”. Ou
ainda melhor, de um: “há algo que eu possa fazer para te ajudar?”.
E se houver, que ajude, mas se
não, que apenas acalente e acolha pois o sofrimento dele, só não é maior do que
o seu porque não é seu! Pense nisso!
Afinal de contas, "cada um sabe a alegria e a dor que traz no coração".
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