sexta-feira, 28 de novembro de 2014

Sobre mulheres contra o feminismo...


Então em minhas andanças pela internet eu descubro que existe uma página no Facebook, filhote de um Blog com o título deste post, onde homens e mulheres alardeiam sua raiva e ódio profundo contra mulheres feministas e suas teorias “de esquerda”. E que para fundamentar seus argumentos citam inúmeras frases de outros tantos blogs que pregam “a morte e violência contra os homens” e, se possível, até a extinção da espécie masculina ou, no mínimo, sua completa subjugação à superioridade feminina. 

E aí, explorando mais um pouco em meu amigo Google, descubro que de fato existe um tumbrl intitulado “eu odeio homens” e que este tumbrl é exatamente sobre o que seu título alardeia e não apenas referência sarcástica. E assim de referência em referência, de blog em blog e matéria em matéria, vou navegando por paginas como Garotas de Direita, Feminismo Diabólico,  onde consta que Simone de Beauvoir era pedófila e que feminismo “não é de Deus” e mata (incluindo um link bizarro entre a morte do menino Bernardo pela louca da madrasta ao movimento feminista!!!! E eu tipo: Oi????) e onde aparecem fotos de garotas feministas comendo sua própria menstruação com frases chocantes que supostamente provariam o quão insanas são essas tais de feministas. 

Devo confessar que esse “passeio virtual” me causa de imediato um desejo imenso de dar reset na humanidade. É oficial: os idiotas e completos imbecis estão tomando conta de todas as frentes de batalha e não há limitação de idade, gênero, ideologia ou nacionalidade. A imbecilidade humana simplesmente não tem limites e nem fronteiras. Esquerda, direita, centro, onde você quiser eles estão lá sendo livremente idiotas nesse espaço tão democrático que é a internet. O segundo pensamento é o mais antidemocrático possível: “PQP quem foi que inventou mesmo essa tal de liberdade de expressão???!!! Evidentemente ele não imaginava o que isso significaria em tempos de internet!!”

De fato a intolerância parece ser a palavra de ordem na maioria esmagadora das comunidades anti e pró qualquer coisa.



Algo, porém que não é levado em consideração por grande parte dos que se sentem ofendidos pelo feminismo, movimentos LGBTs e demais ações afirmativas de “minorias” (as aspas ficam pela minha dificuldade encaixar a nós mulheres como minoria. Já escrevi sobre isso aqui ) é que, ainda que uma parte dos integrantes desses movimentos pregue equivocadamente a violência e reaja à intolerância com mais intolerância, o efeito lesivo é infinitamente menor quando comparado ao inverso, vista a disparidade do poder de fogo social e econômico existente entre hegemonias e minorias. É mais ou menos o exemplo da situação Israel x Palestina. Atos terroristas palestinos, por mais condenáveis que sejam (e o são!), não podem ser comparados e nem justificar atos terroristas chancelados por um Estado democrático que é Israel. Idem para violência policial e assim por diante. Mulheres incitando mulheres a odiarem homens, jamais terão o mesmo “poder de fogo” de homens misóginos que aterrorizam a vida das mulheres (e muitas) há séculos! Basta olhar para os números da violência contra a mulher para quem ainda tiver alguma dúvida. 

Comentários sobre o dia da Mulher e o dia da Consciência Negra do tipo “e o dia do homem?” “não precisamos de consciência negra mas de consciência humana” só dificultam o debate sobre o problema real e sobre as possíveis, necessárias e urgentes soluções. Idem para questões relacionadas à homofobia. Ainda que todas as bibas lindas do mundo se juntassem para espancar os machões homofóbicos do planeta, provavelmente seriam rapidamente aniquiladas após a primeira tentativa. Então como falar de “ditadura gay” e “cadê os direitos dos héteros”? Gente, os direitos dos homens brancos e héteros já estão mais do que garantidos! E não é sobre eles que devemos falar e nem a eles que devemos proteger. Simplesmente não é! Logo, não são esses casos isolados de incitação ao ódio aos homens que devemos combater e sim o machismo!

Muitas dessas mulheres contra o feminismo dizem acharem errado as mulheres quererem ser iguais aos homens, pelo fato de sermos biologicamente diferentes. Que Deus fez a mulher para ser a companheira do homem e não igual ao homem...

Errado para mim é não ter as mesmas oportunidades, é ganhar menos fazendo a mesma coisa ou até mais e melhor! É ter o papel que a sociedade escolheu para você te assombrando em todas as suas escolhas... É ter que viver diariamente com o sexismo, sem  que as pessoas se quer se deem conta disso. “Você até pode fazer tal coisa, mas tem que arcar com as consequências”. Algumas vezes a consequência é “apenas” ter que escolher entre sua carreira e a maternidade, em outras deixar de fazer sexo com aquele cara maravilhoso que você está super afim, mas tem medo de ser julgada, mas infelizmente, em muitas e muitas vezes as “consequências” significam estupro, surra e morte!

Mulheres e homens são biologicamente diferentes assim como mulheres e mulheres e homens e homens. As diferenças que notamos e que fundamentam o machismo nosso de cada dia são muito mais questões sociais e de inconsciente coletivo do que de fato fisiológicas. E ainda que não o fossem, ainda que nosso lado animalesco nos levasse irremediavelmente ao binômio homem-caça mulher-filhos, esse argumento não se sustenta pelo simples fato de que a sociedade não está mais na caverna (embora as vezes não pareça!).

Se é para voltar às origens, vamos então desligar a luz e ficar em volta da fogueira, caçar e plantar nossos próprios alimentos e fechar todos os supermercados. Vamos também acabar com essa história de monogamia e dormirmos todos juntos nus cuidando coletivamente das crias. Praticamente nada do que vemos ao nosso redor faz parte de nossa “natureza”. É, pois é, isso se chama evolução!!! A lógica é mais ou menos a mesma dos dentes do siso. Não é porque você os tem que precisa abrir mão de garfo e faca para cortar os alimentos direto na boca!

Não é porque eu tenho uma vagina que eu tenho que ser submissa a quem tem um pênis e, portanto ganhar menos, aguentar gracinhas, ser violentada de inúmeras formas física e psicologicamente, porque Deus ou a natureza “quiseram assim”. Não preciso que me abram portas ou que me deem flores. Preciso e exijo respeito!

Se o preço para ser respeitada como ser humano e para que a minha vida, o meu trabalho, o meu suor e as minhas lágrimas tenham o mesmo valor que as de um homem for pagar minhas próprias contas e carregar peso ou não ter um lugar no bote salva-vidas, esse preço está é barato, até porque já o pagamos há um bom tempo, sem no entanto termos os benefícios que deveriam a ele estar atrelados.

Então, ainda que meia dúzia de feministas defendam a extinção da espécie masculina (com a qual absolutamente não concordo!) e que sim sejam muito radicais, isso não muda o fato de que precisamos falar sobre feminismo e sobre igualdade de gênero. Isso não muda a realidade diária machista em que vivemos, ao contrário, só a torna cada vez pior.

O feminismo não é necessariamente acadêmico e ele também não é perfeito. Ser feminista não quer dizer nunca cometer deslizes na luta em prol da igualdade de gêneros já que os conceitos enraizados no nosso inconsciente coletivo são profundos. Também não quer dizer odiar os homens e querer uma hegemonia feminina para compensar os séculos de subjugação. Isso não é feminismo. Isso é outra coisa. 

Sou feminista, Beyonce é feminista, Angelina Jolie é feminista, Emma Watson é feminista, Valeska Popozuda é feminista, assim como o foram Alice Walker, Simone de Beauvoir, Leila Diniz e tantas outras que não cabem aqui e também muitos homens!

Cada pessoa contribuindo na luta pelos direitos das mulheres de alguma forma. Eu acredito no feminismo de Chimamanda Ngozi Adiche: “Feminista: a pessoa que acredita na igualdade social, política e econômica entre os sexos.”

E o fato de termos inúmeras mulheres como representantes acirradas do machismo não diminui em nada o valor que o feminismo (clássico ou moderno) de todos os tempos e épocas teve ao nos permitir chegar aonde chegamos e aonde ainda (espero) chegaremos. O fato de mulheres serem machistas não diminui o valor do feminismo. Adoro esse texto do Escreva Lola Escreva


“O opressor não seria tão forte se não tivesse cúmplices entre os próprios oprimidos”, já dizia Simone de Beauvoir.

Então, ainda que você seja anti-feminista, isso não significa que você não precise do feminismo. O mundo precisa de feminismo! A não ser, é claro, que você seja um gato J 

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Um comentário:

  1. "Se é para voltar às origens, vamos então desligar a luz e ficar em volta da fogueira, caçar e plantar nossos próprios alimentos e fechar todos os supermercados. Vamos também acabar com essa história de monogamia e dormirmos todos juntos nus cuidando coletivamente das crias. Praticamente nada do que vemos ao nosso redor faz parte de nossa “natureza”. É, pois é, isso se chama evolução!!! A lógica é mais ou menos a mesma dos dentes do siso. Não é porque você os tem que precisa abrir mão de garfo e faca para cortar os alimentos direto na boca!"

    Perfeito.É o que eu sempre tento dizer.

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